No que você está pensando?
- Clarissa Ganzer

- 6 de nov. de 2013
- 5 min de leitura
Atualizado: 25 de fev. de 2021
6.11.2013 Há pouco mais de um mês, eu apaguei meu Facebook. É, diferente dos mais de 75 milhões de brasileiros que têm uma conta na rede (conforme informações divulgadas pelo G1 e pela Folha de São Paulo), eu resolvi deletar a minha. O Brasil, depois da Índia e dos Estados Unidos, é o país com mais usuários do mundo. Considerando que o Brasil, segundo dados do Censo 2010, tem cerca de 190 milhões de habitantes, os conectados à rede somam aí 40%. Ou seja, quase metade da população daqui tem uma conta e dos que têm um perfil online, mais da metade se conecta diariamente.
Quer dizer, é muita gente, né? Por isso não me espanta que toda vez que a conversa caí no: “te mando pelo face”, ou “me adiciona no Facebook”, eu escuto: “mas, e por que você não tem?”.
Embora, acredite que se trata muito mais de uma pergunta retórica, me incomoda.
Antes que você pense que sou uma antissocial pedante e avessa a qualquer tipo de questionamento, deixo claro que o que me chateia não é a interrogação, mas não saber expressar assim, facilmente, a resposta.
Veja bem, desde os tempos do ICQ (sim, sou da década de 80 e tive ICQ) sempre usufrui dos meios de contato via internet - quando com pessoas que conhecia pessoalmente - como extensões da vida, do contato cara a cara, prolongamentos do convívio, da intimidade e não ao contrário.
Pelo curtíssimo período que fui adepta ao Orkut já me irritava a forma como se recriava a identidade pessoal através das comunidades e de como as relações na rede eram aparentes e absolutamente estratégicas. Sempre foi para o outro. Para o outro saber o que eu quero que ele saiba que eu gosto. Para o outro ver o quão querida sou pelos meus amigos que me deixam depoimentos comoventes. Para que eu saiba que outros entraram em meu perfil e visualizam as fotos que eu permito que vejam. Aaaa!! E isso com fachada de espontaneidade. Entediante, não é mesmo?
Pois é, e aí veio o Facebook e um tempo depois, quando ele nem era tão popular no Brasil, há uns cinco anos, eu comecei a namorar. E olha só, que ótima maneira de ter mais controle em um relacionamento do que o monitoramento constante das histórias online dos amigos do meu namorado? E eu criei um perfil.
A sensação de total inadequação com as postagens desses indivíduos tão maravilhosos que vivem no fantástico e invejável mundo virtual era constante.
Aí, o absurdo aconteceu. Fui alertada pelo Facebook que uma pessoa, um amigo, que já havia falecido, mas que seguia com o perfil na plataforma, estaria completando mais um ano de vida. Em um momento mórbido cliquei no nome do indivíduo e ali visualizei os meus 20 centavos, a gota d’água para que eu me desligasse. Eram inúmeras postagens parabenizando o rapaz pelo seu aniversário. Sério!
Não ridicularizo quem o fez, pois a rede estimula automatização das conveniências sociais e, neste caso, o desejo de felicidades acabou tornando-se um equívoco fúnebre. Aí, eu te pergunto, caro leitor/leitora, por que manter relações de plástico com pessoas que (na grande maioria) não interessam e que não sabem literalmente se seu amigo está vivo ou morto?
Ok, reconheço que se recebe e se troca muita informação na rede e isso facilita a distribuição de ideias. As manifestações de junho, por exemplo, foram estimuladas online e a internet teve papel fundamental na manutenção dos protestos. Igualmente, utilizar a rede pode agregar valor ao camarote da vida (ou não, no caso do empresário paulista. Ops!), e até lançar uma figura/empresa/marca que, através de sua proposta, alcança muitos e passa a ser reconhecida por algo que fez, independente da relevância do feito.
Entretanto, no trato das relações de companheirismo, amizade, o Facebook está muito mais como ouro de tolo para mim, e prefiro ter meu amigo Pedro fisicamente ligado às minhas evidentes imperfeições do que conectado com a projeção sem cicatrizes da minha identidade idealizada.
A quantificação das amizades em detrimento da qualidade dos relacionamentos sempre me aborreceu. Pessoas me são caras e realmente sou apaixonada por todos meus amigos. E se o meio é a mensagem, conforme McLuhan, o meio - a rede, incitou a despersonalização das mensagens. O relevante no Facebook é sempre o outro e o valor na rede é determinado pela quantidade de curtidas e compartilhamentos de quem quer que seja. Não importa para quem o “te amo” ou o “te odeio” é atirado, importa que ele seja acerte o alvo e que seja celebrado.
Não há mais tempo (nem paciência) para profundidade, né? E tudo pode ser facilmente excluído. Momentos são apagados. A memória morreu. E na semana que vem ninguém lembra mais. Já vem chegando um novo perfil mais interessante para te entreter.
Ao invés de uma ponte entre a familiaridade já estabelecida e o contato via internet, o (uso do) Facebook instigou a criação de uma ligação artificial, moldada pela leviandade e hipocrisia. O Facebook é a institucionalização da hipocrisia.
Que necessidade babaca é essa de publicar para nossa aldeia virtual o que estamos pensando e fazendo e comprando e bebendo e consumindo? A vitrine celeste está aí e estamos todos condicionado à venda, mostrando o melhor de nós em um desespero patético por aprovação. É sobre isso que se trata o Facebook: ser aprovado! O constante aperto no F5, esperando a curtida na postagem de segundos atrás, o compartilhamento da foto da viagem em família, ter que estar por dentro de tudo que acontece, sempre, 24horas por dia, 7 dias por semana é tão... desolador.
Inclusive, em outubro deste ano a capa da Carta Capital tratou de uma matéria que mostra que “quanto mais você usa o Facebook, mais você fica infeliz e solitário(a)”. A constatação é resultado de uma pesquisa conduzida pelo Laboratório de Estudos da Emoção e do Autocontrole da Escola de Psicologia da Universidade de Michigan leia mais aqui.
Aliás, ter me libertado do Facebook me deixou menos ansiosa em relação às pessoas e, principalmente, ao trabalho.
Se pode bater algum arrependimento, é quando não recebo um vídeo bobinho, ou quando perco de ver uma montagem engraçada ou ainda quando não acesso uma opinião interessante sobre qualquer coisa (bah!) porque não tenho mais Facebook. (Ah, às vezes, parece que se não tenho Facebook não existo. Incrível). Mas o que mais me deixa saudosista agora é por este texto não estar publicado no meu perfil online, o que poderia fazer com meu pensamente chegasse a várias pessoas. E eu quero ser lida, oras. Entretanto para isso não quero ser surpreendida pela vida construída que não me convém – eu não me importo com a cor do seu pijama e nem com o que você come, desculpa aí! - e não quero ser seduzida a me vender, por meia dúzia de likes. Afinal, o que eu ganho e o que eu perco, a timeline não precisa saber.










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